Não é ao contrario?

Você pode começar este texto questionando se o título ” Como o que você come pode interferir no seu humor” não está escrito ao contrário.

Afinal, de onde vem aquela vontade de comer depois de um evento estressante?

Não seria o seu humor que interfere na suas escolhas alimentares?

Na verdade:

 

A relação entre saúde mental e alimentação é intrincada, bidirecional

e pode variar conforme a relação temporal entre eventos.

 

Podemos estabelecer alguns caminhos para esta associação:

  • alimentos atuando sobre o humor
  • humor interferindo na ingestão de alimentos e escolhas
  • e ainda acrescentar a variável tempo, com efeito imediato e efeito a médio e longo prazo.

E lógico, sem esquecer aquela célebre resposta que mães falam para filhos adolescentes quando trazem a queixa ” mas estão todos fazendo isso!”: “você não é todo mundo! “.

Você é o que você come, como come , como metaboliza e como responde a diferentes tipos de substâncias e ainda pode mudar ao longo da vida de acordo com o que estiver acontecendo a sua volta….

 

doces, doces, doces

Carboidratos, índice glicêmico e humor

 

O índice glicêmico ( IG)é  uma medida do impacto relativo do carboidrato presente nos alimentos  de acordo com a velocidade com que são digeridos, absorvidos, metabolizado e finalmente afetam os níveis de glicose e insulina no sangue.

Um alimento pode provocar aumento de glicemia ( a quantidade de açúcar no sangue) em diferente níveis em pessoas diferentes. Normalmente nos guiamos por uma média, mas algumas pessoas podem ficar distantes desta média. Em outras palavras,  duas pessoas ingerindo a mesma refeição, podem ter uma absorção e reação diferente da outra.

Daí a relevância da frase ” você não é todo mundo”. Ou seja, podemos reagir de formas diversas ao mesmo alimento nas mesmas quantidades.

Alguns estudos apontam as variações rápidas e repetidas da glicemia como causadoras de ansiedade e irritabilidade,  além da hipoglicemia ( baixa quantidade de açúcar no sangue) poder estar associada a quadros depressivos. Estas oscilações ocorrem após ingestão de alimentos com  índice glicêmico mais alto, como pães, batatas, doces….

Portanto, cuidado com quantidade e frequência de consumo destes alimentos. Contudo, não há nada proibido, pois eles podem fazer parte de uma dieta equilibrada tranquilamente.

 

Humor e proteínas

As proteínas são componentes importantes no nosso organismo e a adequada ingestão proteica é vital para desenvolvimento e manutenção do nosso funcionamento.

Alguns estudos correlacionaram uma redução ou ausência de ingestão de carnes vermelhas com aumento  de risco de depressão mesmo após ajustes metodológicos, tanto em homens quanto em mulheres em até 2 vezes. Outros estudos trazem que dietas sem carne vermelha e frango não tem efeito positivo sobre o humor.

Adicionalmente o aumento de consumo de peixes e óleos derivados  também não trouxe benefício para pessoas sem depressão ou ansiedade em termos de humor, mas parece ter efeito positivo quando há um quadro depressivo.

Em suma, as proteínas são necessárias para a sobrevivência humana, em quantidades de acordo com as condições individuais. O excesso não necessariamente trará benefícios, mas a redução certamente tem implicações na saúde geral e mental.

 

Café e Chocolate

Tanto a cafeína presente no café e chocolate quanto a teobromina do chocolate possuem propriedades estimulantes. O chocolate ainda contém anandamidas que agem nos mesmo receptores do sistema nervosos central que a cannabis e a feniletilamina, substancia com ação similar a anfetamina. Todas estas substância promovem sensação de bem estar, melhoram o humor e reduzem a fadiga.

Porém o consumo exagerado pode  estar associado a aumento de ansiedade, enxaqueca e vertigem ,além, claro, de sobrepeso.

Depressão

A associação entre depressão e dieta tem sido bem estabelecida.

Alimentos ultraprocessados, açúcar, grãos refinados e alimentos ricos em gordura estão associados ao aumento dos sintomas depressivos .Estudos demonstram que indivíduos que estão deprimidos são mais propensos a ter pior qualidade da dieta No geral, há fortes evidências de uma associação negativa entre depressão e alimentação saudável, bem como uma associação positiva entre sintomas depressivos e alteração da ingestão calórica. Em subtipos específico de transtorno depressivo há uma aumento de apetite e em outros casos redução.

O consumo excessivo de calorias e de pior qualidade são fatores de risco para  surgimento de diabetes e sobrepeso ou obesidade, condições clínica que por si só estão ligadas a aumento de prevalência de quadros e sintomas depressivos em cerca de 2 a 3 vezes mais. As hipóteses passam pela associação do quadro inflamatório da obesidade e da depressão, microbiota intestinal, alterações de glicemia….

 

 

Mais pesquisas são necessárias para entender os mecanismos que ligam a alimentação ao bem-estar mental, além de determinar como e quando a nutrição pode ser usada para melhorar a saúde mental. Os alimentos citados apesar de suas propriedades, não são aprovados como substituto dos tratamentos convencionais através de medicamentos, mas sim como coadjuvantes interessantes  na melhora dos sintomas ,da qualidade de vida e prevenção.

 

 

 

 

Bibliografia

1.AlAmmar, W.A., Albeesh, F.H. & Khattab, R.Y. Food and Mood: the Corresponsive Effect. Curr Nutr Rep 9, 296–308 (2020).

2.Firth JGangwisch J EBorsini AWootton R EMayer E AFood and mood: how do diet and nutrition affect mental wellbeing? 

3.Keck MM, Vivier H, Cassisi JE, Dvorak RD, Dunn ME, Neer SM, Ross EJ. Examining the Role of Anxiety and Depression in Dietary Choices among College Students. Nutrients. 2020 Jul 11;12(7):2061.