Será que os remédios para tratar a obesidade são seguros para o coração? Existe relação entre o ganho de peso e as doenças cardiovasculares?

“Meu corpo não é meu corpo,

é ilusão de outro ser.

Sabe a arte de esconder-me

e é de tal modo sagaz

que a mim de mim oculta.”  As Contradições do Corpo – Carlos Drummond de Andrade

A obesidade e os riscos à saúde

Nos últimos anos, a pandemia da Covid-19 tirou o foco de uma das principais causas de mortalidade do planeta, a obesidade. As projeções preocupam: para o ano de 2035, estima-se que mais da metade da população mundial terá obesidade ou sobrepeso.

Já é bem conhecida a relação entre o excesso de peso e as doenças cardiovasculares. Porém, um estudo recente da Associação Americana de Cardiologia (AHA) mostrou que, em pouco mais de 20 anos (de 1999 a 2020), triplicaram as mortes por doenças cardiovasculares relacionadas à obesidade: infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, hipertensão e AVC.

Além disso, a obesidade também diminui a expectativa de vida e aumenta o risco de desenvolver outros problemas de saúde. Exemplos:

Tratando a obesidade

Os objetivos do tratamento da obesidade são prevenir, tratar ou reverter suas complicações bem como melhorar a qualidade de vida do indivíduo.

Todos os pacientes com obesidade  ou com sobrepeso devem tentar estabelecer mudanças, como ingerir menos calorias e movimentar-se mais. As mudanças podem ser pequenas e progressivas. O importante é mantê-las no longo prazo.

Tratamento medicamentoso

Tanto a cirurgia quanto as medicações auxiliam no tratamento da obesidade, mas nunca substituem a necessidade de restrição calórica e de aumento do gasto energético.

Deste modo, os remédios podem ser uma boa opção desde que estejam sempre associados a ajustes na dieta e à prática de exercícios físicos. Eles atuam reduzindo o apetite e/ou mudando a forma de digerir a comida, mas é o médico que deve indicar quando e qual tomar.

É importante lembrar que os medicamentos não funcionam da mesma maneira em todos os pacientes. As respostas individuais variam muito e, também por isso, o acompanhamento médico é fundamental.

Os benefícios aparecem!

Com o tratamento medicamentoso, as perdas a partir de 5% do peso do corpo já trazem grandes benefícios à saude: o risco de diabetes, de pressão alta e de outras doenças cardiovasculares diminui significativamente.

Perder de 10% a 25% do peso corpóreo é um excelente resultado terapêutico, mesmo que o paciente ainda esteja longe do seu peso ideal.

O tratamento medicamentoso da obesidade deve sempre estar associado à dieta e à atividade física e está indicado para:

  • Pessoas com índice de massa corpórea (IMC) maior do que 30kg/m2
  • Indivíduos com IMC maior do que 27kg/m2 e com doenças relacionadas à obesidade, como diabetes, pressão alta, apneia do sono, etc.

(Quer calcular seu IMC? Clique aqui.)

Mas será que os remédios para tratar a obesidade são seguros para o coração?

Embora a redução de peso diminua o risco cardiovascular, algumas medicações possuem efeitos colaterais que podem aumentar tal risco:  elevam a pressão arterial e aceleram os batimentos cardíacos.

A sibutramina

A venda da sibutramina foi proibida em vários países desde 2011. Sua associação com o aumento dos casos de infarto e de AVC foi observada num estudo feito com pacientes que tinham pelo menos 55 anos de idade e com diabetes ou doenças cardiovasculares preexistentes.

A sibutramina continua a ser comercializada no Brasil, já que a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia consideraram benéfica sua utilização para pacientes jovens e sem fatores de risco cardiovascular.

A sibutramina age diretamente nos neurotransmissores cerebrais responsáveis pela sensação de saciedade, fazendo com que eles fiquem mais tempo circulando.

Entretanto, seu uso pode aumentar os níveis de pressão arterial e os batimentos cardíacos.

Pacientes com insuficiência cardíaca, arritmia, diabetes, AVC ou história de doença coronariana e infarto prévio não podem tomar sibutramina.

As anfetaminas e seus derivados

Alguns derivados de anfetamina, como a Fentermina, são utilizados para a perda de peso. Todos eles, porém, aumentam a pressão arterial, aceleram os batimentos cardíacos e podem causar arritmias.
Portanto, pessoas que já tiveram infarto ou AVC ou estão com a pressão mal controlada não devem fazer uso destas medicações.

Aqueles que fazem bem ao coração

Os novos medicamentos para controle de peso foram inicialmente desenvolvidos para tratar o Diabetes tipo 2. São eles: os chamados Agonistas do GLP-1 e o de dupla ação, que atua também no Peptídeo Gástrico Inibitório (GIP, sigla em Inglês).

Estas substâncias estimulam a secreção de insulina dependente da glicose e induzem a perda de peso. Como exemplos, a Semaglutida, injetável ou oral, a Liraglutida e, de dupla ação, a Tirzepatida.

O benefício na redução do risco cardiovascular para os pacientes diabéticos tipo 2 está bem estabelecido com estas medicações.

Recentemente, um grande estudo demonstrou redução de 20% do risco de doenças cardíacas graves em pacientes não diabéticos e com doenças cardiovasculares preexistentes. É importante dizer que a redução do risco pode ir além do benefício da redução do peso – seria ação específica da droga.

Cuidado! Atenção aos suplementos alimentares para a perda de peso

Com venda livre pela internet, muitos suplementos alimentares têm adição de substâncias controladas ou proibidas.

Neles já foram encontrados sibutramina, anfetaminas, antidepressivos, diuréticos e calmantes que podem fazer mal, principalmente aos indivíduos com risco cardiovascular aumentado. Pior: estas substâncias não constam dos rótulos e os pacientes não terão acompanhamento médico adequado.

Portanto, não se auto-medique. Procure sempre o seu médico!

Para saber mais sobre a obesidade:

Referências:

https://www.acc.org/latest-in-cardiology/clinical-trials/2010/09/24/11/31/scout#:~:text=Pulse%20was%20also%20higher%20in,group%20(p%20%3D%200.02).

https://abeso.org.br/anvisa-nao-proibe-sibutramina/

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2307563