Atletas morrem do coração, sim, mas felizmente é um evento raro.

“Como as pessoas se sentem é, geralmente, tão importante quanto o que elas fazem” B. F. Skinner

Embora triste e devastadora, a morte súbita de atletas geralmente ocorre na presença de doença não diagnosticada da estrutura do coração. O mais frequente mecanismo de morte é o aparecimento de arritmias malignas desencadeadas pelo estímulo do exercício.

Em atletas jovens, a incidência de morte é baixa, estimada entre 1 para cada 50.000 e 1 para cada 100.000 atletas jovens por ano. Após os 35 anos, essa taxa sobe e chega a 1 para cada 7.000 atletas por ano.

Por que os atletas morrem do coração?

Nos atletas após os 35 anos de idade, a principal causa de morte é a presença de placas de gordura (aterosclerose) nas artérias coronárias, que nutrem o músculo cardíaco.

Já nos atletas com menos de 35 anos, a maior parte das mortes súbitas ocorre pela presença de algumas doenças estruturais do coração, como a cardiomiopatia hipertrófica, as anormalidades congênitas das coronárias, miocardites (inflamação do músculo cardíaco) ou ainda arritmias hereditárias.

A cardiomiopatia hipertrófica

A cardiomiopatia hipertrófica é uma doença relativamente comum que acomete cerca de 1 em cada 500 indivíduos. É uma condição genética, familiar, que causa hipertrofia de parte do músculo cardíaco (assimétrica) e que pode provocar dificuldade para o bombeamento do sangue. Isto causa sintomas como falta de ar, dor no peito e síncope. Também pode provocar arritmias, falência do músculo cardíaco e morte súbita. Por ser comum, é uma das principais doenças estruturais que pode levar à morte de atletas.

O que o exercício pode provocar no coração?

Os treinos prolongados podem induzir mudanças na estrutura cardíaca, como o aparecimento de fibrose, dilatação ou hipertrofia que facilitam o surgimento de arritmias.

As demandas imediatas de um treino intenso, como a liberação de adrenalina, as alterações dos sais do corpo, a desidratação e as variações de pressão também podem favorecer o aparecimento de arritmias em corações suscetíveis.

E o coração de atleta?

O coração de atleta é uma adaptação normal e só se desenvolve em quem se expõe ao treinamento físico intenso, rotineiro e prolongado. É importante dizer que as alterações no músculo cardíaco são reversíveis caso haja interrupção do treinamento, pois isto muitas vezes ajuda a diferenciar as adaptações relacionadas ao exercício de doenças estruturais do coração.

O treinamento físico intenso pode levar à hipertrofia do músculo cardíaco, à dilatação das cavidades ventriculares, à diminuição dos batimentos cardíacos em repouso (a bradicardia, isto é, menos do que 60 batimentos por minuto), à melhor distribuição do sangue. Tudo isto resulta em maior oferta de oxigênio aos tecidos e melhora da performance. Portanto, o coração cresce e fica mais eficiente.

Mulheres têm adaptações menos pronunciadas do que os homens. Também, a incidência de morte súbita é menor nestas atletas (3 a 5 vezes menos).

Mas, se os atletas morrem, devo praticar exercícios?

Claro que sim! A morte de atletas é rara e relacionada a doenças não diagnosticadas previamente. O importante é submeter-se às avaliações médicas periódicas antes e depois de começar a praticar exercícios!

Existem recomendações de avaliação cardiológica para a pré-participação em esportes, levando em consideração a história clínica, a história familiar, a idade e o tipo de esporte praticado pelo atleta.

Ainda, a literatura médica especializada é contundente ao estabelecer os benefícios cardiovasculares que acontecem com a prática regular de atividade física.

Em 2020, a Organização Mundial da Saúde, em sua nova diretriz, recomenda que adultos (de 18 a 65 anos) façam atividade física moderada de 150 a 300 minutos semanais; ou de 75 a 150 minutos semanais de atividade física intensa.

Crianças e adolescentes devem praticar ao menos 60 minutos diários de atividade física moderada a intensa.

Idosos com mais de 65 anos devem ser tão ativos quanto sua capacidade funcional permitir. Então, as atividades físicas com múltiplos componentes (por exemplo, o equilíbrio funcional e a força) realizadas em três ou mais dias da semana, podem prevenir quedas e melhorar sua capacidade funcional.

Mulheres grávidas e no pós-parto devem fazer pelo menos 150 minutos de atividade física moderada semanalmente. Aquelas que praticavam atividades intensas podem continuar a praticar na gestação e no pós-parto. Da mesma forma, avaliação médica pode ajudar!

Benefícios do exercício

A prática regular de exercícios físicos traz vários benefícios:

  • Queima calorias e auxilia na perda de peso
  • Diminui o risco de morte prematura
  • Diminui a mortalidade por doença arterial coronária e reduz o risco de AVC
  • Melhora o controle de açúcar e pode prevenir ou mesmo adiar o aparecimento de Diabetes tipo 2
  • O exercício aeróbico ajuda a diminuir a pressão arterial de hipertensos
  • Melhora o perfil lipídico do sangue, aumentando o bom colesterol e diminuindo os triglicérides
  • Reduz o estresse, a ansiedade, a depressão
  • Ajuda a prevenir a osteoporose e reduz o risco de fraturas
  • Auxilia o fortalecimento e o equilíbrio de idosos, prevenindo quedas
  • Pode reduzir o risco de desenvolvimento do câncer de intestino, mamas e próstata
  • Retarda ou evita o aparecimento de demência.

Pratique, sim!

Consulte seu médico antes de começar e, periodicamente, depois de se apaixonar pelo bem estar que o exercício proporciona!

 

Referências:

  1. Ghorayeb N, Stein R, Daher DJ, Silveira AD, Ritt LEF, Santos DFP et al. Atualização da Diretriz em Cardiologia do Esporte e do Exercício da Sociedade Brasileira de Cardiologia e da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte – 2019. Arq Bras Cardiol. 2019; 112(3): 326-368.
  2. Arnett DK, Blumenthal RS, Albert MA, Buroker AB, Goldberger ZD, Hahn EJ, Himmelfarb CD, Khera A, Lloyd-Jones D, McEvoy JW, Michos ED, Miedema MD, Muñoz D, Smith SC Jr, Virani SS, Williams KA Sr, Yeboah J, Ziaeian B. 2019 ACC/AHA guideline on the primary prevention of cardiovascular disease: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines. Circulation. 2019; 140: e596–e646. DOI: 10.1161/CIR.0000000000000678
  3. Visseren FLJ, et al. 2021 ESC Guidelines on cardiovascular disease prevention in clinical practice: Developed by the Task Force for cardiovascular disease prevention in clinical practice with representatives of the European Society of Cardiology and 12 medical societies With the special contribution of the European Association of Preventive Cardiology (EAPC). European Heart Journal, ehab484, https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehab484 Published: 30 August 2021.
  4. Differentiating Athletes Heart from Left Ventricle Cardiomyopathies.
    Abulí M, de la Garza MS, Sitges M.J Cardiovasc Transl Res. 2020 Jun;13(3):265-273. doi: 10.1007/s12265-020-10021-8. Epub 2020 May 14.PMID: 32410209 Review.

 

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