imagem de sanfona

A obesidade é uma doença. Ela é  complexa, recorrente e associada a diversas complicações.

Muita gente perde um pouco de peso com tratamentos clínicos. Outros perdem muito peso, outros um pouco ao longo de anos, outros muito em pouco tempo. Tem gente que literalmente “briga” com a balança desde a infância, outros começam o vai e vem do peso mais tarde. Efeito sanfona, efeito ioiô, independentemente de como já apelidaram este fenômeno, uma pessoa com várias dietas e ganhos de peso pode facilmente já ter conseguido perder ao longo de 20 anos, cerca ¼ de tonelada e continuar com mesmo peso ou com peso maior que o inicial.

Imagine alguém que tem 90 kg. Faz uma dieta e  perde 30kg. Porém ganha 5 kg em um mês depois, e perde várias vezes ao longo do ano, suponha mais umas 6 vezes. Em 1 ano mais 60 kg. Logo depois, nos próximos 2 anos ganha mais 40kg e depois perde em 2 anos cerca de 30 kg. Então fica oscilando 8 kg para cima e para baixo na balança. Bom, isso já são uns 90 + 8+8+8= 114kg.  Imediatamente se engaja em novo tratamento. Pouco depois, com 120kg, perde 20kg ,em 1 ano, ganha 10kg, perde 15kg, ganha 10kg e por aí vai. No final de 20 anos facilmente conseguirá perder 250kg e ganhar tudo de novo e mais um pouco….iôiô

Na prática, as pessoas com obesidade conseguem muitas vezes perder peso, entretanto manter esta perda ao longo do tempo é  tarefa de Hércules.

Cada vez que perdemos peso, acionamos uma série de mecanismos fisiológicos compensatórios que interferem no gasto energético, na fome e na vontade de comer, levando ao ganho de peso.

Ou seja, depende menos da nossa vontade ou do desejo de permanecer naquela faixa de peso do que poderíamos supor pelo o que constantemente ouvimos por aí.

 

obesidade na consulta médica
Na consulta médica

Na consulta médica

O fato é que todos, algum dia, vamos ao médico e, se houver sobrepeso, será inevitável ouvir que precisamos perder um pouco de peso para melhorar isso ou aquilo.

Mas quanto doutor? Ah, vamos ver seu IMC. Sabe o que é isso?

Pela Organização Mundial da Saúde, a pessoa tem obesidade quando seu Índice de Massa Corporal (IMC) é maior ou igual a 30 kg/m2. A faixa de peso saudável pela OMS varia entre 18,5 e 24,9 kg/m2. Atualmente o IMC é a medida mais utilizada para a classificação do grau de sobrepeso e obesidade. Apesar de todas as limitações, é bastante simples e prático. Basta dividir o seu peso em quilogramas pelo valor da altura em metros ao quadrado.

Mas voltando a nossa consulta médica, quanto preciso perder de peso? Após o calculo do IMC, você pode verificar quanto falta para conseguir atingir o IMC considerado saudável, correto?

Então, quando classifico apenas pelo IMC, vejo um corte temporal na vida desta pessoa. A partir deste ponto posso traçar um plano para poder ajudá-la.

Ao determinar  o objetivo de peso com IMC considerado saudável (19, a 24,9kg/m2), estou tentando mantê-la o mais longe possível das consequências indesejadas da obesidade.

No entanto, uma perda de peso de 5 a 10%  já tem relação com vantagens para saúde independentes do IMC final. De forma similar, perdas de peso de 3% ou menos estão associadas a benefícios na fertilidade e nos níveis de glicose. Adicionalmente, perda de peso de 7% tem sido associado a um menor risco de diabetes tipo 2, onde cada quilo perdido foi associado uma redução de 16% no risco de diabetes . Assim como perdas  acima de 10% têm efeitos importantes na esteatose hepatica, em marcadores metabólicos e em quadros de depressão.

Obesidade reduzida e obesidade controlada

Pensando em como melhorar a abordagem terapêutica, a ABESO( Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica)  em conjunto com  a SBEM ( Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), lançaram recentemente uma proposta bastante interessante no artigo

“Proposal of an obesity classifcation based on weight history: an offcial document by the Brazilian Society of Endocrinology and Metabolism (SBEM) and the Brazilian Society for the Study of Obesity and Metabolic Syndrome (ABESO)”

A ideia é baseada em se levar em conta o maior peso atingido ao longo da vida (não contam aqui o peso da gestação , lactação e algumas situações especiais descritas nos artigo), em população adulta ( 18 a 65 anos) e com valores de IMC entre 30 e 50kg/m2.

A partir deste dado podemos classificar a obesidade como inalterada se próxima ao maior peso atingido, reduzida de houve uma perda de peso de 5 a 10% ou controlado se a perda de peso é maior que 10%. Da mesma forma para pessoas com IMC maior que 40 kg/m2 e menor que 50kg/m2, a obesidade controlada precisa de perdas maiores que 15% e reduzida entre 10 e 15%. Se a perda for inferior a 10% nesta faixa de IMC, é considerada como inalterada.

 Esta classificação não visa substituir a atual, mas, sim, complementar, trazendo para o foco central uma visão mais ampla da relação do peso com estado clínico do indivíduo.

Qual a importância disso? Esta novas correlações permitem um desenho de tratamento mais personalizado e sustentável ao longo da vida, possivelmente reduzindo a chance do famoso efeito sanfona, ou como quiser chamar. Mesmo perdas modestas devem ser valorizadas e o mais importante, devem ser mantidas.

Também ajuda a reduzir o estigma da obesidade nos ambiente de saúde,  adicionalmente melhorando a adesão ao tratamento a longo prazo ao deixar mais evidente o caráter fisiológico, crônico e recorrente da doença com estabelecimento de objetivos mais realistas de acordo com a história de cada um.

Duas pessoas com mesmo IMC podem ter trajetórias de peso completamente diferentes e merecem abordagens diferentes!

 

 

 

 

Referências:

 

1.Halpern B, Mancini MC, de Melo ME, Lamounier RN, Moreira RO, Carra MK, Kyle TK, Cercato C, Boguszewski CL. Proposal of an obesity classification based on weight history: an official document by the Brazilian Society of Endocrinology and Metabolism (SBEM) and the Brazilian Society for the Study of Obesity and Metabolic Syndrome (ABESO). Arch Endocrinol Metab. 2022 Apr 28;66(2):139-151.

2.https://www.endocrino.org.br/

3.https://abeso.org.br/