Jejum intermitente: um novo estilo de vida. (Imagem: ededchechine – www.freepik.com)
Por que tanta gente está aderindo ao jejum intermitente?
“Mangia che te fa bene”
O famoso ditado italiano “Coma que te faz bem” é parte de nossas vidas. Quando nasce uma criança, quase todo o esforço dos pais é voltado para nutri-la. Porque entre humanos, a alimentação é mais que sobrevivência: é também afeto e conforto. Além disso, pratos saborosos dão prazer, reúnem famílias, aproximam amigos e permitem bons negócios. E quando alguém adoece, os cuidados e o carinho também são expressos oferecendo-se alimentos para a recuperação da saúde.
Por outro lado, hoje a obesidade se tornou um dos maiores desafios de saúde em todo o mundo. Essa situação faz repensar os nossos padrões alimentares, e a importância de buscar o equilíbrio à mesa.
História e razões para jejuar
A prática do jejum faz parte de muitas culturas e crenças espirituais milenares. Cristãos, muçulmanos, judeus, budistas, praticantes de ioga e meditação fazem períodos de privação alimentar tradicionalmente.
Também os habitantes de Icaria, na Grécia, conhecidos por extraordinária longevidade, entre diversas peculiaridades de estilo de vida e padrão alimentar, fazem de 40 dias consecutivos até um total de 150 dias de jejum anualmente, cristãos-ortodoxos que são.
Mas, do ponto-de-vista científico, o jejum passou a ganhar projeção quando, em 2016, o prêmio Nobel de Medicina foi concedido ao Dr Ohsumi. Nos estudos realizados ao longo de mais de 4 décadas, ele provou que o jejum, por ativar a autofagia, consegue retardar o processo de envelhecimento. Isso passou a estimular não apenas um vasto campo de pesquisa, mas também a embasar novos comportamentos alimentares.
Na TV BBC de Londres, o documentário “Eat Fast, Live Longer“, do médico e jornalista Dr Mosley (2012) mostrou como o jejum seria possível na rotina de cidadãos comuns, e que poderia ser eficaz para fazer perder peso e ter mais saúde. Em adição à onda provocada então por esta série, os livros “The 5:2 diet”, de Kate Harrison e “O código da obesidade: decifrando os segredos da prevenção e cura da obesidade” do Dr Fung (um best-seller) facilitaram a popularização da prática.
Enfim, seja pela fé, pela busca de melhor saúde e ter maior longevidade, o jejum acena promissor.
Quem não pode fazer jejum intermitente?
Atenção: o jejum pode ser prejudicial e perigoso em particular para
- pessoas com histórico de distúrbios alimentares como anorexia nervosa ou bulimia nervosa
- gestantes e mulheres amamentando
- portadores de doenças crônicas como diabetes, cirrose, insuficiência cardíaca ou renal, enfisema
- em uso de medicamentos antidiabéticos não devem fazer jejum.
Se houver dúvidas se sua condição de saúde permite ou não fazer jejum, procure supervisão profissional individual.
O jejum pode melhorar a saúde?
A partir de 12 horas de jejum, caem os níveis de glicose e de insulina. E já ocorre ativação da autofagia nas células. Nos jejuns mais curtos, acreditava-se que o metabolismo fosse mobilizado de maneira a poupar o cérebro. Mas hoje, ao contrário, sabe-se que nesse curto prazo a autofagia já começa a atuar nos neurônios.
A autofagia é um processo pelo qual as células reciclam e renovam seu conteúdo, destroem os microrganismos e descartam as estruturas deterioradas. É, portanto, um meio de renovação e sobrevivência das células.
Enfim, a autofagia pode melhorar as funções fisiológicas das células, reduz a inflamação, inibe o envelhecimento e elimina patógenos. Dessa forma, teria papel protetor contra doenças como câncer, demência e Parkinson. E, acredita-se, pode ser uma chave para a longevidade. As pesquisas buscam evidências que estabeleçam se isso acontece de fato.
Como é feito o jejum intermitente?
O jejum intermitente consiste em alternar períodos sem e com alimentação. Para isso, existem diversos protocolos em voga, e aplicativos que orientam a sua prática. Os mais utilizados são 16:8 (ficar 16 horas sem comer, e alimentar-se no intervalo de 8 horas), 5:2 (deixar de se alimentar por dois dias ao longo da semana) e o de dias alternados: comer normalmente um dia, e no dia seguinte ficar em jejum, e assim sucessivamente. Além disso, costuma-se liberar a ingestão de água durante o jejum, de maneira a assegurar a boa hidratação.
Recentemente, começaram a surgir evidências de que esses padrões de jejum, em pessoas sem doenças crônicas, quando combinados com dieta e estilo de vida saudáveis são razoavelmente seguros e bem tolerados.
Mas permanecem as recomendações de, nas refeições, preferir frutas e vegetais frescos, grãos integrais, proteínas de boa qualidade e as gorduras poliinsaturadas. Acrescentando, também, a importância da atividade física com vistas a construir tônus muscular. Portanto, não vale só fazer jejum prolongado, e depois comer descontroladamente, sem se exercitar!
Mas, afinal de contas, jejum intermitente emagrece?
Na realidade, não há evidências científicas de que o jejum intermitente possa promover perda significativa de peso. Esse padrão alimentar ajuda a emagrecer as pessoas que se identificam com o estilo de dieta, e que conseguem realmente restringir as calorias no período em que se alimentam. Então, emagrecem não porque fizeram jejum prolongado, mas porque reduziram a soma total das calorias diárias ingeridas.
Veja a fala do Dr Bruno Halpern, no seu perfil no Instagram, sobre as evidências científicas da utilidade do jejum intermitente para promover emagrecimento.
Aviso: O texto traz informações atualizadas na data registrada. Por ser um assunto relativamente novo, faltam evidências científicas mais sólidas para se recomendar o jejum intermitente. Não se conhecem quais são os padrões mais eficazes, os limites de segurança e as indicações específicas para as diferentes pessoas. Jamais substitua o conhecimento aqui compartilhado pela avaliação individual e o aconselhamento do seu médico.
Referências:
Welton et al. Intermittent fasting and weight loss. Canadian Family Physician February 2020, 66 (2) 117-125.
de Cabo R, Mattonson MP. Effects of intermittent fasting on health, aging, and disease.New England Journal of Medicine, December 2019.
Effect of Alternate-Day Fasting on Weight Loss, Weight Maintenance, and Cardioprotection Among Metabolically Healthy Obese Adults: A Randomized Clinical Trial. JAMA Internal Medicine, May 2017
Metabolic Effects of Intermittent Fasting. Annual Review of Nutrition, August 2017.
Lowe et al. Effects of TRE on WL: the TREAT RCT. JAMA Int Med 2020.
Halpern, Mendes. Intermittent Fasting for obesity and related disorders: unveiling myths facts and presumptions. Archives of Endocrinology and Metabolism 2021
https://www.health.harvard.edu/blog/intermittent-fasting-surprising-update-2018062914156