Enfim, férias! Malas prontas.

Viajar para destinos onde se pode praticar mergulho é uma uma experiência emocionante e gratificante. 

Escolher o mar dos seus sonhos, Ilha Bela, Ubatuba, talvez Fernando de Noronha, Galápagos ou quem sabe o Caribe ou até mesmo Bonair. Ver a vida submarina, recifes de corais, peixes das mais variadas cores, tartarugas, e tanto mais. 

Não basta escolher um destino paradisíaco, mergulhar exige preparo: curso de mergulho, certificação, equipamento, seguro.

Tudo certo, mas dependemos ainda das condições meteorológicas e principalmente cuidados com a saúde. 

Sabemos que as atividades de mergulho, principalmente com cilindro não são isentas de complicações. A principal delas é o barotrauma do ouvido que pode até comprometer a segurança do mergulhador. E tudo pode ser ainda pior se logo na véspera da viagem o nariz fica obstruído; um resfriado ou piora da rinite. 

 

Barotrauma do ouvido, muito mais comum do que se imagina!!

Como já citado, o barotrauma do ouvido é das complicações mais frequentes do mergulho, segundo estudos, ocorre em 23.2% dos mergulhadores militares e ainda mais alto no mergulho recreacional, chegando a cerca de 70%!

Quais são os principais sintomas?

Os sintomas mais típicos incluem: 

  • dor de ouvido (80%)
  • sensação de ouvido tampado (52%)
  • perda auditiva (5,9%). 
  • zumbido (4,7%)
  • vertigem

Mais raramente podem ocorrer: paralisia facial, fístula do labirinto, perfuração do tímpano. 

Por que isso acontece?

A orelha média, a parte do ouvido que contém os minúsculos ossinhos martelo, bigorna e estribo é uma câmara de ar que permite a vibração destes com o tímpano. A pressão do ar aumenta à medida que mergulhadores descem na água e diminui quando retornam à superfície. 

O espaço do ouvido médio é coberto por mucosa e está conectado à garganta através da tuba auditiva. Esta abre-se na parte de trás do nariz  sendo responsável pela troca de ar entre a nariz e a câmara do ouvido médio, mantendo pressão igual entre este e do meio externo. Isso é conhecido como equalização da pressão do ouvido médio.

No mergulho, durante a descida a equalização da pressão da orelha média deve ser ativa. O mergulhador deve fazer manobras de compensação, como a manobra de Valsalva, entre outras. Na descida ocorrem 95% das complicações.

Manobras ruins ou insuficientes de compensação são responsáveis pelo barotrauma. E na presença de congestão nasal ou ainda qualquer inflamação da via respiratória, como um simples resfriado ou rinite alérgica descontrolada, a compensação da pressão torna-se muito difícil.

Quais os fatores de risco?

Rinite, resfriados ou outras infecções das vias respiratórias e ainda alterações anatômicas da cavidade nasal como desvio septal por exemplo.

Como evitar?

A realização correta das manobras de compensação é o ponto chave. Não se deve estar resfriado, a rinite deve estar controlada. E se há qualquer sintoma de obstrução nasal crônica, esta deve ser avaliada por um otorrinolaringologista antes do batismo do mergulho. 

Há situações que ainda podem agravar a possibilidade de barotrauma do ouvido médio. A viagem de avião! Muitas vezes são necessários mais de um vôo e não é raro que também em condições de ar pressurizado apareça um barotrauma do ouvido.  Recomenda-se assim, um intervalo de 24 a 48 horas entre o último vôo e o mergulho. 

O que fazer? 

Os barotraumas mais leves tem curta duração. Mascar chicletes, bocejar, exercícios de respiração podem ser suficientes para reduzir os sintomas. 

Deve-se procurar atendimento médico para tratar a congestão nasal e as complicações mais graves. Podem ser necessários medicamentos para descongestionar o nariz, anti-alérgicos, corticoides, analgésicos, entre outros. 

Em situações extremas há indicações de cirurgias, para aspirar a secreção que se forma na orelha média ou reconstrução da membrana timpânica nos casos em que há perfuração do tímpano que não cicatrizou espontaneamente. 

Prepare-se para seu mergulho e siga estritamente as recomendações dos instrutores.

Nunca mergulhe resfriado, com alergia ou qualquer congestão nasal.

Respeite o tempo entre o vôo e o mergulho, principalmente se o ouvido estiver tampado.

Boas férias!!

Referências:
Lindfors OH, Räisänen-Sokolowski AK, Suvilehto J, Sinkkonen ST. Middle ear barotrauma in diving. Diving Hyperb Med. 2021 Mar 31;51(1):44-52. doi: 10.28920/dhm51.1.44-52. PMID: 33761540; PMCID: PMC8313771.
Meyer MF, Knezic K, Jansen S, Klünter HD, Pracht ED, Grosheva M. Effects of freediving on middle ear and eustachian tube function. Diving Hyperb Med. 2020 Dec 20;50(4):350-355. doi: 10.28920/dhm50.4.350-355. PMID: 33325015; PMCID: PMC8026226.
ONeill OJ, Brett K, Frank AJ. Middle Ear Barotrauma. 2023 Aug 8. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan–. PMID: 29763026.
Torp KD, Murphy-Lavoie HM. Return to Diving. 2022 May 29. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan–. PMID: 29763198.

Escrito por

Renata Di Francesco

Graduada em Medicina em 1993 pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), e especializada em Otorrinolaringologia pelo Hospital das Clínicas da FMUSP. Doutorado em 2001 e o título de Professora Livre-Docente foi obtido em 2010.
No dia a dia dedica, no consultório privado o cuidado com pacientes e familiares.
Ainda no Hospital das Clínicas da FMUSP, hoje, coordena o Estágio em Otorrinolaringologia Pediátrica.
Outros desafios:
Diretora da Educação Médica Continuada da ABORLCCF (2012-2014)
Presidente da Academia Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica (2015-2016)
Diretora Secretária da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia (2015),
Diretora do Departamento de Otorrinolaringologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo-SPSP (2016-2019)
Coordenadora do Grupo de Trabalho sobre Desenvolvimento e Aprendizagem da SPSP (desde 2019)
Diretora do Departamento de Otorrinolaringologia da Sociedade Brasileira de Pediatria -SBP (desde 2019).