conscientização para doação de órgãos

Setembro Verde é o mês da campanha por mais doadores de órgãos! No Brasil, existem hoje cerca de 41 mil pessoas aguardando na fila de espera por um transplante de órgão.

Mas, o que é a doação de órgãos? E o transplante? Por quê, e como fazer? Quão seguro é esse processo todo?

O que é Transplante de Órgão?

Para começar, vamos entender o que é o transplante de um órgão. É uma procedimento cirúrgico que substitui um órgão adoecido, ou já sem função, por um outro saudável. Sim, implanta-se um órgão que tanto pode ser doado por uma pessoa viva, como por um doador cadáver. O mais comum é essa última alternativa. Isto é, o doador é alguém que faleceu há poucas horas, e seus órgãos são aproveitáveis se forem rapidamente retirados e implantados na pessoa doente. Podem ser utilizados: fígado, rins, coração, pulmão, pâncreas, intestino, rins, córnea, vasos, pele, ossos e tendões.

doaçã de coração
No Brasil, o dia 27 de setembro foi instituído como o Dia Nacional da Doação de Órgãos, pela Lei nº 11.584/2007. 

Como é a Lei de Transplantes de Órgãos?

No Brasil, a Lei dos Transplantes (Lei 9.434, de 1997 e alterações do Decreto nº 9.175, de 2017) regulamenta a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano.

Quando o doador é cadáver, existe um rigoroso processo de comprovação de morte encefálica (“morte cerebral”). Controvérsias à parte, a legislação em vigor determina que a família é a responsável pela decisão final se o órgão do falecido pode ser doado ou não. É interessante constatar que, em nosso país, a decisão da família se sobrepõe ao desejo registrado do falecido. Sim, mesmo que o desejo de doar esteja registrado no documento de identidade (RG), a família tem o poder de negar a retirada dos órgãos.

Quem pode doar órgãos?

Doador Vivo: é preciso ser maior de idade, juridicamente capaz, e familiar do receptor. Mas, se o candidato a doador não for parente do receptor, é possível obter uma autorização judicial. Ele pode doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula ou parte do pulmão para seu ente querido.

doação de fígado

Doador Cadáver: requer comprovação de morte encefálica, sob cuidados em UTI, e com autorização do familiar responsável. De um único doador, podem ser retirados os rins, coração, pulmões, pâncreas, fígado e intestino. E também as córneas, válvulas, ossos, músculos, tendões, pele, veias e artérias.

Qual é a situação atual no Brasil em relação aos transplantes de órgãos?

O Brasil é referência mundial em transplantes de órgãos. Possui o maior sistema público de transplantes de órgãos, tecidos e células, custeado pelo SUS. É também o segundo país em números absolutos de transplantes de órgãos já realizados. A quase totalidade desses procedimentos (95%) é realizada no âmbito do sistema público.

Desde o início do isolamento da pandemia da covid-19, houve queda de cerca 40% nos procedimentos de transplante. Também as doações reduziram 8,4% as doações de órgãos, quando se comparam os períodos de janeiro a julho de 2019 para o mesmo período em 2020.

A importância da família no processo de doação dos órgãos

Na “hora H”, é a família do falecido que detém o poder de autorizar ou não a doação do órgão. Mas a taxa de recusa tem sido de quase 40%!

Os 4 principais motivos da recusa são:

  1. Desconhecimento da vontade do doador,
  2. Não confiar no diagnóstico de morte encefálica,
  3. Medo de deformação do corpo,
  4. Motivos religiosos.

Fake news prejudicam os doentes que aguardam por um órgão

Desde que existem as redes sociais, circulam boatos que criam insegurança. Há histórias aterrorizantes de corpos de crianças encontradas congeladas sem os rins. Já escreveram até mesmo que a covid-19 foi uma invenção criada para internar pessoas saudáveis e isolá-las da família até a morte, a fim de alimentar o tráfico de órgãos no mercado negro. São histórias inverossímeis, conforme se esclarecem em sites como www.boatos.org.

Contudo, é verdade que o comércio e tráfico de órgãos, principalmente de rins, é uma das grandes preocupações mundiais. A Declaração de Istambul sobre tráfico de órgãos e turismo de transplante de 2008, reeditada em 2018, chama os governos dos países para a responsabilidade de coibir e proteger os indivíduos vulneráveis. A Declaração do Vaticano em 2020 também reconhece o tráfico de órgãos e de seres humanos como “verdadeiros crimes contra a humanidade”, e congrega líderes religiosos, políticos e sociais no enfrentamento a essa situação.

É possível “comprar” um órgão?

Não é possível “comprar” um órgão no Brasil. Em nosso país, o Sistema Nacional de Transplantes (SNT) regulamenta, controla e monitora o processo de doação, captação e distribuição dos órgãos para fins terapêuticos. Há uma lista única de espera por cada Secretaria da Saúde, com cadastros separados por órgãos, tipo sanguíneo (ABO, Rh) e outras especificações. E é preciso frisar: a lista não discrimina se o candidato a receber o órgão provém do sistema privado ou público. Todas as instituições aptas a transplantar estão inscritas no mesmo sistema. E sujeitas às mesmas regras. Por isso, a fila segue critérios técnicos de gravidade e de tempo de inclusão na lista. Os pacientes que aguardam a doação acompanham a sua posição online.

Além disso, as cirurgias de transplante necessitam de infraestrutura hospitalar de excelência, equipes multidisciplinares com elevada especialização. Desde a retirada dos órgãos até a implantação nos receptores, as características do doador, o tempo gasto, todas as etapas são minuciosamente documentadas. E o paciente transplantado utiliza medicações de alto custo, que reduzem sua imunidade. Assim, ele vai requerer cuidados e monitorização pela vida toda.

A distribuição de órgãos centralizada pelo SNT e a complexidade dos cuidados no pós-transplante exigem transparência no processo. 

Doação de Órgãos: com clareza e sem mitos

Então, é importante saber que

  • A morte encefálica acontece quando a irrigação sanguínea ao cérebro está interrompida. É, portanto, uma situação incompatível com a vida, isto é, irreversível.
  • Os critérios de morte encefálica são avaliados com rigor, e obedecem aos padrões científicos nacionais e internacionais. Além disso, o registro de morte encefálica é obrigatório, independente da intenção da doação de órgãos.
  • O corpo não fica deformado com a doação.
  • Não existe limite de idade para ser doador.

Portanto, toda a sociedade precisa dialogar sobre esse assunto. Em especial, as comunidades religiosas e os núcleos familiares podem fazer toda a diferença. Já circulam entre nós, hoje, milhares de pessoas que levam uma vida praticamente normal e de boa qualidade, graças a um órgão recebido por doação nas últimas décadas. É preciso aumentar as oportunidades dos doentes que aguardam na fila pela oportunidade de receber um transplante.

Por que ser doador de órgãos?

Hoje, esse assunto pode não dizer respeito a você. Mas e se, amanhã, alguém que você ama, ou mesmo você precisar de um órgão?

Os órgãos não farão falta para quem partiu, ou para quem acaba de perder um ente querido. Mas um único doador ajuda dez pessoas a continuar suas vidas. É um ato de generosidade, de empatia. Enfim, de humanidade.

No video abaixo, Antônio Muccini canta para celebrar a vida que recuperou graças a um órgão doado:

(Fonte: https://www.facebook.com/tudosobrefigado)

Avise sua família: “eu sou doador(a) de órgãos”.

“O ideal do amor e da verdadeira generosidade é dar tudo de si, mas sempre sentir como se isso não houvesse lhe custado nada.” Simone de Beauvoir (1908 – 1986)

Referências

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-615-de-27-de-maio-de-2021-*-326187507
https://site.abto.org.br/
https://antigo.saude.gov.br/saude-de-a-z/doacao-de-orgaos
www.tudosobrefigado.com.br

Escrito por

Marta Deguti

Médica hepatologista, nipo-paulistana de nascimento e de coração, casada, mãe de dois filhos, de um cãozinho e de uma gatinha.