floaters

“Minha paixão
Há de brilhar na noite
No céu de uma cidade
Do interior
Como um objeto não identificado
Como um objeto não identificado…”
Caetano Veloso

E, de repente, um objeto esquisito ganha seu campo visual. Tenta tirar da frente com as mãos.. desvia com o olhar.. procura novamente.. e ele está lá, onde ele quer, independente das suas ações!
Vai passando o tempo e ele até some. Ainda bem! Amanhã será um outro dia!
Eis que acorda, e ele está lá!!!

Chamamos de “moscas volantes” ou “floaters” (voadores).

O que, afinal, seria isso?

Lá vamos nós para o olho:

o olho
modelo anatômico do olho

Ele não é oco. É preenchido por uma gelatina transparente que chamamos de corpo vítreo.

O corpo vítreo

É feito por muuuuuita água e uma pequena porcentagem de fibras de colágeno (por elas que a consistência é mais para gel do que para líquido). Fibras de colágeno, como o cabelo! Mas a natureza é tão perfeita que, no olho, a disposição destas fibras assume uma arquitetura tal que opticamente fica tudo transparente.

E o colágeno?

Com o passar do tempo, por volta dos 50 anos, o colágeno… murcha. Por tudo. Inclusive nos olhos. Assim, perdemos um pouco daquela estrutura perfeitamente transparente, e a gelatina “empelota” em formas variáveis: mosca, abelha, teia de aranha, cobra, OVNIs! Nos alto míopes isso pode ocorrer antes.

Descolamento do vítreo

O processo continua, até que, de fato, o vítreo “encolhe”. Neste momento, ele se desprende da retina (no desenho, esta área vermelho-alaranjada que reveste toda a parede interna do olho). Aí sim precisamos ter cuidado: nas áreas em que o vítreo é mais grudado (borda da retina, vasos e ao redor do nervo óptico), neste momento de descolamento, pedacinhos de vasos ou retina podem rasgar.
Como um durex numa folha de papel: quando puxamos o durex, se a cola ainda está forte, rasgamos o papel. Quanto mais fininha a retina, e quanto mais forte a cola (tração), mais fácil a rasgadura. Este pode ser o princípio do Descolamento de Retina (que fica para o próximo post, aguardem!!!).
O importante aqui é o que podemos sentir neste momento de tração do descolamento do vítreo: flash de luz em forma de arco, bem na borda do campo visual. Como se um clarão viesse das laterais, você até se vira para saber de onde vem.. Chamamos “fotopsias”.

Sinais de Alerta

Um ou outro OVNI é normal! Com o passar do tempo, a estrutura do colágeno muda mesmo, e ganhamos mais esses prêmios.
1. Entretanto, se da noite para o dia eles aumentam, pode ser um sinal de que o vítreo encolheu (todos se uniram no centro do olho ou da visão) e portanto se desprendeu. Pode também ser um sinal de que não seja o colágeno aglutinado, e sim outro material: sangue ou inflamação.
2. Fotopsias, ou os flashes luminosos: sinal de tração e possível rasgo na retina. Mas calma!!!! Ainda bem que a retina é resistente e a Natureza reina: os rasgos acontecem em 1 em cada 10 mil pessoas. Nos alto míopes, como a retina é mais fina, isso pode ocorrer em 1 em cada 100 alto míopes. Por vezes, a história familiar também contribui nesta estatística.

Assim, na dúvida, convém procurar um oftalmologista. Conseguimos, com o laser, “soldar” a retina para que ela não se descole. Obviamente todo tratamento tem seu efeito colateral, e deve ser feito somente quando necessário.

Sharma P, Sridhar J, Mehta S. Flashes and Floaters. Prim Care. 2015 Sep;42(3):425-35. doi: 10.1016/j.pop.2015.05.011. PMID: 26319347.

 

Escrito por

Cassia Suzuki

Médica oftalmologista, quase filósofa, mãe de 2 filhas e 2 cachorrinhas